Cláudio Caldas

 

Samba de Terreiro ou Samba de Quadra: cadê vocês?

Amigos do Samba...

Ainda nem acabou o carnaval - hoje ainda é terça gorda - e eu fico perguntando para as paredes: que samba das Escolas de Samba - do Rio, de São Paulo, de Floripa ou de qualquer outra cidade - "pegou" neste início de 2005? Pois é moçada...eu sei que a minha memória não é mais a mesma.. tudo bem... mas então me ajudem. Eu não percebi nenhum. Nem o, antigamente, tão procurado disco das Escolas de Samba do Rio teve grande divulgação.

Parece que o que ocorre é que as agremiações, ou melhor, as direções das Escolas de Samba cada vez menos se preocupam com a razão de ser de suas existências: o samba. Talvez importe mais o carnavalesco, a grandiosa alegoria, os ensaios da comissão de frente ou do casal de mestre-sala e porta-bandeira. Por conta desta desvalorização do samba já disse eu uma vez para um presidente de uma Escola de Samba de Floripa e repito agora: um desfile pode ser realizado sem carnavalesco... pode rolar sem alegoria, sem mestre-sala, sem porta-bandeira, sem comissão de frente e até sem fantasias... mas sem samba, sem a melodia ... ah sem este sim, é impossível. Mas reparem, amigos, que a cada ano que passa o samba fica mais esquecido, exatamente, nas Escolas de Samba. Seria engraçado. Mas é trágico e muito, muito triste.

E é bem por isso também que não ficamos mais sabendo dos sambas de terreiro, aqueles feitos no meio do ano, fruto da inspiração de grandes compositores, estimulados por amores perdidos ou novos ou por acontecimentos do dia-a-dia dos poetas e autores de samba. Nas Escolas, lamentavelmente, não existem mais espaços para que novos compositores possam mostrar suas obras. Apenas existe o concurso de escolha do samba de enredo, que é um samba encomendado, todo engessado que, obrigatoriamente, têm que versar sobre o assunto que a diretoria quer ver exaltado. Muitas vezes uma encomenda mais parecida com um jingle do que propriamente com um samba.


Numa reunião ideal, Mano Décio, Silas de Oliveira, Noel Rosa de Oliveira,
Dona Ivone Lara e Cartola.

Como não existem mais os encontros naturais nas escolas, apenas os "ensaios", onde ingressos e cervejas garantem os cofres das agremiações que repetem o samba escolhido à exaustão para a "comunidade", os sambistas ficam restritos e o samba mesmo desaparece. Fico pensando...neste esquema a gente nem conheceria almas como Monarco, Casquinha, Zé Kéti, Carlos Cachaça, Nélson Cavaquinho, Cartola, Dona Ivone Lara, Mano Décio da Viola, Silas de Oliveira, Geraldo Babão, Noel Rosa de Oliveira, Trambique e tantos outros que desfilaram melodias e letras nos terreiros e quadras de suas Escolas de Samba.

O samba era de terreiro porque as agremiações não tinham cobertura. Ficavam em terrenos grandes com uma casinha, servindo de birosca e sede, no meio. Com este desenho as pessoas se encontravam mais seguidamente e faziam as suas rodas de samba e gracejos com as pastoras. Depois vieram as quadras, já cobertas, onde também - graças a uma estrutura melhor - já se podia confinar uma quantidade bem maior de cerveja gelada no boteco da Escola. Foi a vez das composições e dos compositores. E que obras! Quanto talento! Mas o tempo foi retirando essa gente do raio de influência das Escolas que passaram a "restringir", com muito respeito, todos eles nas "Velhas Guardas". Assim ficaram com as suas consciências mais leves.


O Bloco Cacique de Ramos desfilando sob a égide de seu totem.

Onde isso não ocorreu - como no caso do Bloco Carnavalesco Cacique de Ramos - surgiram novos compositores e belas obras de meio de ano, do dia-a-dia. Surgiram grupos como o Fundo de Quintal, talentos como Almir Guineto, Zeca Pagodinho, Jorge Aragão, Dudu Nobre e tantos outros - Graças a Deus - que a gente insiste em ouvir e gosta muito.

Que o mercado fique com os Sambas de Enredo atuais, cada vez mais iguais e marchados... tudo bem. Mas que permita que as rodas de samba e os pagodes continuem florescendo aqui e ali e novos compositores, letristas e ritmistas possam aparecer para gente curtir.

Vou nessa. Se desejarem comentar mandem mensagens para moranafilosofia@netlan.net .

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